Passar para o conteúdo principal

Utilização de amostras obtidas por broncoscopia para decidir como tratar infeções pulmonares em pessoas com fibrose quística

Mensagens-chave

Encontrámos evidências em dois pequenos estudos que incluíam apenas crianças.

Não sabemos qual a melhor forma de obter amostras que indiquem quais os antibióticos que devem ser prescritos para uma infeção pulmonar.

Qual é o contexto da revisão?

A FC é uma doença genética que provoca lesões nos pulmões, no sistema digestivo e noutros órgãos. Os problemas respiratórios nas pessoas com FC devem-se principalmente a infeções pulmonares recorrentes. A cultura microbiana a partir de amostras de muco expelido pelas vias respiratórias inferiores pode permitir aos médicos identificar rapidamente o microrganismo que está a causar a infeção e iniciar o tratamento precocemente. Se as pessoas não conseguirem expelir muco, são feitas zaragatoas da parte superior da garganta para identificar o microrganismo que está a causar a infeção nas vias respiratórias inferiores, mas este pode não ser o método mais fiável.

Durante uma broncoscopia, os médicos examinam as vias respiratórias inferiores utilizando um tubo longo, fino e flexível com uma luz e uma câmara numa das extremidades; podem também recolher muco. O doente tem de ser sedado ou submetido a anestesia geral. Não sabemos se o tratamento baseado em amostras colhidas durante uma broncoscopia é melhor do que o tratamento baseado em esfregaços da garganta.

Esta revisão atualiza uma revisão publicada pela primeira vez em 2013.

O que queríamos investigar?

Queríamos saber se se devem utilizar amostras obtidas por broncoscopia para decidir como tratar as infeções pulmonares em pessoas com fibrose quística (FC).

O que fizemos?

Procurámos estudos que envolvessem pessoas de qualquer idade com FC. Comparámos e resumimos os resultados dos estudos e classificámos a nossa confiança na evidência com base em fatores como a metodologia e tamanho dos estudos.

O que encontrámos?

Incluímos dois estudos nesta revisão, que envolveram 186 crianças. Um estudo recrutou 170 bebés com menos de seis meses de idade aos quais foi diagnosticada FC e acompanhou-os durante cinco anos. O segundo estudo incluiu 30 crianças com FC entre os cinco e os 18 anos de idade e acompanhou-as durante dois anos. Em ambos os estudos, os participantes foram divididos em dois grupos de forma completamente aleatória, sendo que a um grupo foram administrados antibióticos com base em amostras colhidas por broncoscopia e ao outro grupo foram administrados antibióticos com base em amostras colhidas na garganta. No estudo maior, as crianças foram submetidas a uma broncoscopia quando apresentavam características de agravamento dos sintomas torácicos, ao passo que as crianças do estudo mais pequeno foram submetidas a uma broncoscopia quando apresentavam um aumento do Índice de Desobstrução Pulmonar, que é um marcador de doença pulmonar precoce que mede a capacidade do ar se mover dentro dos pulmões.

Resultados principais

Nenhum dos estudos mostrou qualquer diferença entre os grupos em termos de função pulmonar, peso, índice de massa corporal ou na pontuação calculada por uma tomografia computorizada (TC) dos pulmões, quando medida aos dois ou cinco anos. O estudo maior também mostrou que não havia diferença no número de crianças em cada grupo que tinham uma infeção por Pseudomonas aeruginosa aos cinco anos de idade, ou por ano de acompanhamento, ou na frequência com que uma criança se sentia mal com sintomas respiratórios. Neste estudo maior, as crianças do grupo da broncoscopia foram admitidas no hospital com mais frequência, embora as admissões tenham sido geralmente mais curtas do que no grupo de comparação. Não houve diferença entre os grupos no custo global dos cuidados de saúde e nas pontuações da qualidade de vida relacionada com a saúde.

Os efeitos secundários notificados durante e após a broncoscopia não foram graves; o efeito secundário mais frequente foi o aumento da tosse (num terço das crianças).

Atualmente, não existem provas suficientes para apoiar a utilização regular da broncoscopia para diagnosticar e tratar infeções pulmonares em crianças com FC.

Quais são as limitações da evidência?

As evidências limitaram-se a dois estudos. Embora estes estudos tenham sido bem concebidos, não foi possível combinar os seus resultados porque utilizaram métodos de medição diferentes. Temos pouca confiança na fiabilidade da evidência para a maioria dos resultados e confiança moderada para dois resultados (pontuação da tomografia computorizada de alta resolução e análise do custo dos cuidados). Não podemos ter a certeza dos resultados devido ao pequeno número de crianças incluídas. Além disso, os estudos incluíram apenas crianças pequenas, pelo que não sabemos se os resultados seriam os mesmos em adultos com FC. Uma vez que o tratamento de uma primeira infeção por Pseudomonas aeruginosa é altamente bem sucedido, são necessários estudos maiores e mais longos para detetar pequenas diferenças entre os grupos. A realização de estudos desta envergadura é extremamente difícil e devem ser utilizadas medidas mais sensíveis.

Quão atualizada se encontra esta evidência?

Pesquisámos evidência médica publicada até novembro de 2023.

Introdução

O diagnóstico e o tratamento precoces das infeções do trato respiratório inferior constituem a base da gestão da doença pulmonar na fibrose quística (FC). Quando as amostras de expetoração não estão disponíveis, o diagnóstico baseia-se principalmente em culturas de espécimes orofaríngeos; no entanto, existem preocupações quanto ao facto desta abordagem ser suficientemente sensível para identificar organismos das vias respiratórias inferiores.

A broncoscopia e os procedimentos relacionados, como a lavagem broncoalveolar (BAL), são invasivos, mas permitem a recolha de amostras das vias respiratórias inferiores de pessoas que não produzem expetoração. As culturas de amostras broncoscópicas fornecem um maior rendimento de organismos em comparação com as de amostras orofaríngeas. A utilização regular da broncoscopia e de procedimentos relacionados pode aumentar a precisão do diagnóstico das infeções do trato respiratório inferior e melhorar a seleção de antimicrobianos, o que pode conduzir a benefícios clínicos.

Esta é uma atualização de uma análise anterior publicada pela primeira vez em 2013 e atualizada em 2016 e 2018.

Objetivos

Avaliar a utilização de terapêutica antimicrobiana guiada por broncoscopia (também conhecida por broncoscopia dirigida) no tratamento da infeção pulmonar em adultos e crianças com fibrose quística.

Métodos de busca

Realizámos pesquisas no Cochrane Cystic Fibrosis Trials Register, compilado a partir de buscas em bases de dados eletrónicas e pesquisas manuais em revistas e atas de congressos. Também pesquisámos três registos de estudos em curso e as listas de referências de artigos e revisões relevantes. A data das pesquisas mais recentes foi 1 de novembro de 2023.

Critério de seleção

Incluímos ensaios controlados aleatorizados envolvendo pessoas de qualquer idade com FC, que compararam os resultados de terapias antimicrobianas guiadas pelos resultados da broncoscopia (e procedimentos relacionados) versus aquelas guiadas por qualquer outro tipo de amostragem (por exemplo, culturas de expetoração, esfregaço de garganta e esfregaço de tosse).

Coleta dos dados e análises

Dois autores da revisão selecionaram os estudos, avaliaram o risco de viés e extraíram os dados de forma independente. Contactámos os investigadores dos estudos para obter mais informações, quando necessário. Utilizámos os critérios GRADE para avaliar a o grau de confiança da evidência.

Principais resultados

Incluímos dois estudos nesta revisão atualizada.

Um estudo incluiu 170 bebés com menos de seis meses de idade aos quais tinha sido diagnosticada FC através do rastreio neonatal. Os participantes foram seguidos até aos cinco anos de idade, estando disponíveis dados relativos a 157 crianças. O estudo comparou os resultados das exacerbações pulmonares após tratamento dirigido por BAL versus tratamento padrão baseado em características clínicas e culturas orofaríngeas.

O segundo estudo incluiu 30 crianças com FC com idades compreendidas entre os cinco e os 18 anos e aleatorizou os participantes para receberem tratamento baseado em resultados microbiológicos de BAL desencadeados por um aumento do índice de depuração pulmonar (LCI) de pelo menos uma unidade acima da linha de base ou para receberem tratamento padrão baseado em resultados microbiológicos de amostras orofaríngeas recolhidas quando os participantes eram sintomáticos.

Considerámos que ambos os estudos tinham um baixo risco de viés na maior parte dos domínios, embora o risco de viés para a ocultação da alocação e o relato seletivo não fosse claro no estudo mais pequeno. No estudo maior, o poder estatístico para detetar uma diferença significativa na prevalência de Pseudomonas aeruginosa foi baixo porque o isolamento de Pseudomonas aeruginosa em amostras de BAL aos cinco anos de idade em ambos os grupos foi muito inferior à taxa esperada que foi utilizada para o cálculo do poder. Classificámos o grau de certeza da evidência para os resultados-chave como baixo, exceto para a pontuação da tomografia computorizada de alta resolução e para a análise do custo dos cuidados, que classificámos como de certeza moderada.

Ambos os estudos relataram resultados semelhantes, mas não foi possível efetuar uma meta-análise devido às diferentes formas de medir os resultados e às diferentes indicações para a utilização de BAL.

O facto de a terapia antimicrobiana ser dirigida pelo uso de BAL ou pelos cuidados padrão pode fazer pouca ou nenhuma diferença na pontuação z da função pulmonar após dois anos (n = 29), conforme medido pela alteração da linha de base no ICV e no volume expiratório forçado num segundo (VEF1) (grau de confiança na evidência baixo). Aos cinco anos, o estudo maior encontrou pouca ou nenhuma diferença entre os grupos na pontuação z absoluta do VEF1 ou na capacidade vital forçada (CVF) (grau de confiança na evidência de baixo). A terapia dirigida por BAL provavelmente faz pouca ou nenhuma diferença em qualquer medida de pontuações torácicas avaliadas por tomografia computadorizada (TC) em dois ou cinco anos (medidas diferentes usadas nos dois estudos; evidência de qualidade moderada). A terapia dirigida por BAL pode fazer pouca ou nenhuma diferença nos parâmetros nutricionais ou no número de isolados positivos de P. aeruginosa por participante por ano, mas pode levar a mais hospitalizações por ano (1 estudo, 157 participantes; grau de confiança na evidência baixo). Provavelmente, não há diferença no custo médio dos cuidados por participante (quer em termos de hospitalizações quer em termos de custos totais) aos cinco anos entre a terapia dirigida por BAL e os cuidados padrão (1 estudo, 157 participantes; grau de confiança na evidência moderado).

Não encontrámos qualquer diferença na qualidade de vida relacionada com a saúde entre a terapêutica dirigida por BAL e os cuidados padrão aos dois ou cinco anos, e o estudo maior não encontrou qualquer diferença no número de isolados de Pseudomonas aeruginosa por criança e por ano. A taxa de erradicação após um ou dois cursos de tratamento de erradicação e o número de exacerbações pulmonares foram comparáveis nos dois grupos. Os eventos adversos ligeiros, quando notificados, foram geralmente bem tolerados. O evento adverso relatado mais comum foi o agravamento transitório da tosse após 29% dos procedimentos. Foi documentada uma deterioração clínica significativa durante ou nas 24 horas após a BAL em 4,8% dos procedimentos.

Conclusão dos autores

Esta revisão, limitada a dois ensaios clínicos controlados e aleatorizados bem concebidos, não mostra evidências que apoiem a utilização de rotina da BAL para o diagnóstico e tratamento da infeção pulmonar em crianças em idade pré-escolar com FC, em comparação com a prática padrão de tratamento com base nos resultados da cultura orofaríngea e nos sintomas clínicos. Não existe evidência disponível para adultos.

Notas de tradução

Traduzido por: Ângelo Luís, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior. Revisão final: Assunção Vaz-Patto, Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade da Beira Interior e Ricardo Manuel Delgado, Knowledge Translation Team, Cochrane Portugal.

Citation
Jain K, Wainwright CE, Smyth AR. Bronchoscopy-guided antimicrobial therapy for cystic fibrosis. Cochrane Database of Systematic Reviews 2024, Issue 5. Art. No.: CD009530. DOI: 10.1002/14651858.CD009530.pub5.

O nosso uso de cookies

Usamos cookies necessárias para fazer nosso site funcionar. Gostaríamos também de definir cookies analíticos opcionais para nos ajudar a melhorar nosso site. Não vamos definir cookies opcionais a menos que você as habilite. A utilização desta ferramenta irá colocar uma cookie no seu dispositivo para lembrar as suas preferências. Você sempre pode alterar suas preferências de cookies a qualquer momento clicando no link 'Configurações de cookies' no rodapé de cada página.
Para informações mais detalhadas sobre as cookies que utilizamos, consulte nossa Página das Cookies.

Aceitar todas
Configure