A cola cirúrgica previne a fístula pancreática pós-operatória (fuga de líquido do pâncreas) e promove a cicatrização após a cirurgia?

Mensagens-chave

- A cola cirúrgica pode fazer pouca ou nenhuma diferença na fístula pancreática pós-operatória em pessoas submetidas à remoção da cauda pancreática.

- Não sabemos se a cola cirúrgica tem um efeito na fístula pancreática pós-operatória em pessoas submetidas à remoção da cabeça do pâncreas.

- Também não sabemos se a cola cirúrgica tem um efeito na taxa de mortalidade em pessoas submetidas a qualquer uma destas cirurgias pancreáticas.

O que é uma fístula pancreática pós-operatória?

Uma fístula pancreática pós-operatória é uma complicação potencialmente fatal que pode seguir-se a uma cirurgia de grande envergadura para tratamento de cancro ou inflamação do pâncreas. O pâncreas é uma glândula digestiva situada na parte posterior do abdómen superior. Uma fístula ocorre quando o coto pancreático ou a reconexão entre o pâncreas e o intestino próximo não cicatriza corretamente, criando uma fuga de suco pancreático do pâncreas para o tecido abdominal. Isto atrasa a recuperação da cirurgia e muitas vezes requer um tratamento adicional para assegurar a cura completa.

Como é que isso é evitado?

A "cola" cirúrgica - também designada por "adesivo de tecido cirúrgico" - é um produto derivado do sangue humano ou animal, utilizado para fechar feridas e ajudar a controlar a hemorragia em várias cirurgias. A cola cirúrgica tem sido utilizada nos últimos anos para prevenir a fístula pancreática pós-operatória após cirurgia pancreática. No entanto, a sua eficácia e segurança neste tipo de cirurgia é ainda incerta.

O que queríamos investigar?

Queríamos descobrir se a cola cirúrgica é eficaz na prevenção da fístula pancreática pós-operatória após cirurgia pancreática em qualquer contexto de cuidados, em comparação com a ausência de cola. Analisámos:

- taxa de fístula pancreática pós-operatória;
- taxa de mortalidade;
- taxa global de complicações;
- taxa de operação adicional;
- se houve efeitos nocivos ou indesejáveis;
- qualidade de vida relacionada com a saúde/estado de saúde dos participantes;
- custo hospitalar;
- duração total do internamento hospitalar.

O que fizemos?

Procurámos estudos que comparassem a utilização de cola cirúrgica com a não utilização de cola em pessoas submetidas a cirurgia pancreática. Comparámos os resultados dos estudos e classificámos a nossa confiança na evidência com base em fatores como a metodologia e o tamanho dos estudos.

O que descobrimos?

Encontrámos 14 estudos no total, com 1.989 participantes. Dividimos os estudos em três grupos de comparação, uma vez que as pessoas nestes estudos foram submetidas a três tipos diferentes de operações pancreáticas, exigindo diferentes aplicações de cola cirúrgica.

Comparação 1 
Encontrámos 8 estudos com 1.119 participantes que foram submetidos à remoção da "cauda" do pâncreas. Nesta operação, é aplicada cola cirúrgica no coto pancreático. Em comparação com a ausência de cola, a cola cirúrgica pode fazer pouca ou nenhuma diferença:

- taxa de fístula pancreática pós-operatória;
- taxa global de complicações.

A cola cirúrgica pode reduzir ligeiramente a taxa de operações adicionais em comparação com a ausência de cola. Não se registaram efeitos nocivos ou indesejáveis relacionados com a utilização de cola cirúrgica nestes estudos. No entanto, não sabemos se a sua utilização tem um efeito sobre:

- taxa de mortalidade;
- duração total do internamento hospitalar.

Estes 8 estudos não incluíram dados sobre a qualidade de vida relacionada com a saúde/estado de saúde dos participantes e sobre os custos hospitalares.

Comparação 2
Encontrámos 5 estudos com 519 participantes que foram submetidos a remoção da "cabeça" do pâncreas. Nesta operação, os cirurgiões criam uma ligação entre o coto pancreático e o intestino delgado, e é aplicada cola cirúrgica para reforçar esta ligação. Não sabemos se a cola cirúrgica tem algum efeito:

- taxa de fístula pancreática pós-operatória;
- taxa de mortalidade;
- taxa de operação adicional;
- custo hospitalar.

Em comparação com a ausência de cola, a cola cirúrgica pode fazer pouca ou nenhuma diferença:

- taxa global de complicações;
- duração total do internamento hospitalar.

Não se registaram efeitos nocivos ou indesejáveis relacionados com a utilização de cola cirúrgica nesta comparação. Estes estudos não incluíram dados sobre a qualidade de vida relacionada com a saúde/estado de saúde dos participantes.

Comparação 3
Encontrámos dois estudos com 351 participantes que foram submetidos à remoção da "cabeça" do pâncreas, onde é utilizada cola cirúrgica para selar o ducto pancreático principal. Não sabemos se a utilização de cola cirúrgica tem algum efeito:

- taxa de mortalidade;
- taxa global de complicações;
- taxa de operação adicional.

Em comparação com a ausência de cola, a cola cirúrgica pode aumentar os efeitos indesejáveis (diabetes mellitus) nestes doentes. Pode fazer pouca ou nenhuma diferença na duração total do internamento hospitalar.

Esses dois estudos não relataram a taxa de fístula pancreática pós-operatória, o custo hospitalar e a qualidade de vida relacionada à saúde/estado de saúde dos participantes.

Quais são as limitações da evidência?

Não estamos confiantes na evidência porque é possível que as pessoas nos estudos estivessem cientes do tratamento que estavam a receber, e nem todos os estudos forneceram informações sobre tudo o que estava interessado. Alguns estudos não relataram claramente como foram conduzidos e não existem estudos suficientes para ter a certeza sobre os resultados dos nossos resultados.

Quão atualizada se encontra esta evidência?

Procurámos estudos que tivessem sido publicados até março de 2023.

Notas de tradução: 

Traduzido por: João Pedro Bandovas, Serviço de Cirurgia Geral, Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central. Revisão final: Ricardo Manuel Delgado, Knowledge Translation Team, Cochrane Portugal.

Tools
Information