A terapia de movimentos de dança é um tratamento efetivo para a depressão? Uma revisão da evidência

Resumo para leigos

Existem benefícios da terapia de movimento de dança para pessoas com demência?

Mensagens-chave

Não sabemos se a terapia de movimento de dança é uma intervenção eficaz para a demência. É necessária mais investigação neste campo, especialmente no que diz respeito ao impacto da terapia do movimento de dança na depressão.

O que é a demência?

A demência afeta o pensamento e a memória e a forma como as pessoas são capazes de gerir as tarefas diárias. As pessoas com demência podem também ter dificuldade em acompanhar conversas, ficar confusas e ter alterações de humor em alturas diferentes. Estes sintomas podem afetar a comunicação e levar à solidão, causando consequentemente depressão e aumento dos níveis de stress.

Como é que a demência é tratada?

A demência pode ser tratada recorrendo a medicamentos para reduzir os sintomas. No entanto, estão a começar a surgir intervenções complexas que abordam a pessoa como um todo. Há também um interesse crescente na utilização da dança e de outras formas de arte para as pessoas com demência.

O que pretendíamos encontrar?

Queríamos avaliar o impacto da terapia de movimento de dança em diferentes aspetos da vida de uma pessoa em comparação com nenhum tratamento, cuidados padrão ou qualquer outro tratamento. Os principais resultados que nos interessavam eram os problemas gerais de comportamento e bem-estar mental, a cognição (pensamento e memória), a depressão e a qualidade de vida. Também queríamos comparar diferentes formas de terapia de movimento de dança.

O que fizemos?

Procurámos cuidadosamente na literatura estudos que comparassem um grupo de pessoas com demência que fizeram terapia de movimento com dança com outro grupo de pessoas com demência (o grupo de controlo). Para que a comparação fosse justa, a atribuição de uma pessoa a um determinado grupo tinha de ser decidida aleatoriamente. Encontrámos apenas um estudo que era adequado para incluir na nossa revisão. O estudo foi realizado em Hong Kong e envolveu 204 pessoas. Algumas delas com diagnóstico de demência ligeira e outras sofriam de problemas ainda mais ligeiros de pensamento e memória. Neste estudo, os investigadores compararam a terapia do movimento de dança com o exercício e com uma lista de espera. Compararam os grupos no final da terapia e novamente três e nove meses depois.

O que é que encontrámos?

Não encontrámos qualquer diferença entre a terapia de movimento com dança e o exercício, ou a lista de espera, para o comportamento geral e o bem-estar mental, ou para a cognição. Relativamente à depressão, verificámos que pode haver um pequeno efeito benéfico da terapia de movimento com dança em comparação com o exercício ou a lista de espera, e este efeito ainda estava presente três e nove meses após o fim da terapia. No entanto, não temos a certeza se o efeito foi suficientemente grande para ser realmente percetível para as pessoas com demência. O estudo não mediu a qualidade de vida dos participantes.

Quais são as limitações desta evidência?

Só foi selecionado um estudo, pelo que a quantidade de evidência era reduzida. O estudo foi bem conduzido, mas nem todos os participantes tinham demência (alguns tinham défices mais ligeiros) e não sabemos até que ponto os resultados se aplicam apenas a pessoas com demência. Por estas razões, não temos a certeza se a terapia de movimento de dança é eficaz no apoio a pessoas com demência ligeira e não podemos nada concluir sobre os seus efeitos na demência moderada ou grave. São necessários mais estudos para se poder afirmar com certeza se a terapia de movimentos de dança é benéfica para pessoas com demência de qualquer gravidade.

Quão atualizada se encontra esta evidência?

A última pesquisa foi realizada a 8 de junho de 2022.

Conclusão dos autores: 

Esta revisão incluiu um ECA com baixo risco de viés. Devido ao baixo grau de certeza das provas, os verdadeiros efeitos da TMD como intervenção para a demência podem ser substancialmente diferentes dos encontrados. São necessários mais ECAs para determinar com alguma confiança se a TMD tem efeitos benéficos na demência.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A demência é uma síndrome de comprometimento cognitivo adquirido, suficientemente grave para interferir com uma vida independente. Ao longo da doença, pessoas com demência também experienciam alterações a nível emocional, do comportamento e das relações sociais. Segundo a Alzheimer's Disease International, a demência afeta cerca de 55 milhões de pessoas em todo o mundo. A última diretriz do NICE para a demência salienta o valor de diversas opções de tratamento para as diferentes fases e sintomas da demência, incluindo tratamentos não farmacológicos. A literatura relevante defende também o valor das intervenções que reconhecem a complexidade da doença e abordam a pessoa como um todo, incluindo os seus processos físicos, emocionais, sociais e cognitivos. De forma crescente, a literatura destaca a capacidade das artes e tem incorporado práticas para abordar esta complexidade. A terapia de movimento de dança (TMD) é uma intervenção psicológica incorporada que pode abordar a complexidade e, por conseguinte, ser útil para pessoas com demência, mas a sua eficácia continua por esclarecer.

Objetivos: 

Avaliar os efeitos da terapia de movimento de dança nos sintomas comportamentais, sociais, cognitivos e emocionais das pessoas com demência, em comparação com a ausência de tratamento, os cuidados habituais ou qualquer outro tratamento. Além disso, para comparar diferentes formas de terapia de movimento de dança (p.e. terapia de movimento de dança baseada em Laban, terapia de movimento de dança Chacian ou Movimento Autêntico)

Métodos de busca: 

Pesquisámos os registos de Cochrane Dementia and Cognitive Improvement Group, MEDLINE (Ovid SP), Embase (Ovid SP), PsycINFO (Ovid SP), CINAHL (EBSCOhost), Web of Science Core Collection (Clarivate), LILACS (BIREME), ClinicalTrials.gov e o meta-registo do Portal Internacional de Registo de Ensaios Clínicos da Organização Mundial da Saúde até 8 de dezembro de 2022.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios controlados aleatorizados (ECAs) que incluíram pessoas com demência, de qualquer idade e em qualquer ambiente. A intervenção TMD tinha de ser realizada por um praticante de terapia de movimento de dança que (i) tivesse recebido formação formal (ii) fosse um terapeuta de movimento de dança em formação ou (iii) fosse de outra forma reconhecido como terapeuta de movimento de dança no país em que o estudo foi realizado.

Coleta dos dados e análises: 

Dois autores de revisão selecionaram, independentemente, os estudos para inclusão, extraíram os dados e avaliaram a qualidade metodológica. Expressámos as estimativas de efeito utilizando a diferença média (DM) entre os grupos de intervenção e apresentámos os respetivos intervalos de confiança (IC). Utilizámos os métodos GRADE para avaliar a nossa certeza nos resultados.

Principais resultados: 

Encontrámos apenas um estudo elegível para inclusão nesta revisão. Este foi um ECA de 3 braços e grupos paralelos realizado em Hong Kong que envolveu 204 adultos com perturbação neurocognitiva ligeira ou demência. O estudo examinou os efeitos da TMD em grupo a curto prazo (12 semanas) em comparação com exercício e um grupo de controlo em lista de espera, imediatamente após a intervenção, e a três e nove meses depois.

No final da intervenção, a TMD pode resultar em pouca ou nenhuma diferença nos sintomas neuropsiquiátricos avaliados com o Inventário Neuropsiquiátrico de 12 itens quando comparada com a lista de espera (MD 0,3, IC 95% -0,96 a 1,56; evidência de baixa qualidade) ou exercício (MD -0,30, IC 95% -1,83 a 1,23; evidência de baixa qualidade). Também não houve qualquer evidência de efeitos em momentos posteriores.

O funcionamento cognitivo foi avaliado com uma variedade de instrumentos e não houve diferenças estatisticamente significativas entre os grupos (evidência de baixa qualidade). Quando comparada com exercício ou a lista de espera, a TMD pode resultar em pouca ou nenhuma diferença na função cognitiva imediatamente após a intervenção ou no seguimento.

Em comparação com a lista de espera, a TMD pode resultar numa ligeira redução da depressão avaliada com a Escala de Depressão Geriátrica de 4 itens no final da terapia (MD -0,60, IC 95% -0,96 a -0,24; evidência de baixa qualidade). Este ligeiro efeito positivo da TMD nos resultados da depressão manteve-se três e nove meses após a conclusão da intervenção. A TMD também pode reduzir ligeiramente a depressão em comparação com o exercício no final da terapia (MD -0,40, IC 95% -0,76 a -0,04, evidência de baixa qualidade), um efeito que também se mantém aos três e nove meses.

O nosso quarto resultado primário, a qualidade de vida, não foi avaliado no estudo incluído.

Havia dados para dois dos nossos resultados secundários, o funcionamento social e ocupacional e as desistências (que utilizámos como indicador de aceitabilidade), mas em ambos os casos a evidência era de certeza muito baixa e, por isso, a nossa confiança nos resultados era muito baixa.

Para todos os resultados, considerámos que a certeza da evidência em relação aos objetivos da nossa revisão era baixa ou muito baixa consoante os termos GRADE devido à falta de rigor (porque nem todos os participantes no estudo incluído tinham um diagnóstico de demência) e à imprecisão.

Notas de tradução: 

Traduzido por: Ana Luísa Delgado, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Revisão final: Ricardo Manuel Delgado, Knowledge Translation Team, Cochrane Portugal.

Tools
Information