Novos tratamentos versus tratamentos estabelecidos em ensaios clínicos randomizados

A randomização refere-se a alocação aleatória de participantes para para determinar qual dos tratamentos que estão sendo testados cada participante do estudo receberá. Este procedimento é usado em ensaios clínicos para comparar os efeitos dos tratamentos e descobrir qual deles é preferível. No entanto, a alocação aleatória só é ética se houver incerteza genuína sobre qual das opções de tratamento é preferível. Se um paciente ou seu provedor de saúde estiver certo de qual dos tratamentos está sendo comparado, é preferível que não concorde com a randomização. Isto porque esta atitude envolveria o risco de pacientes receberem um tratamento que já se acreditava ser inferior. As decisões sobre a participação em ensaios clínicos randomizados são mais difíceis devido à crença generalizada de que novos tratamentos devem ser inevitavelmente superiores aos tratamentos (padrão) existentes. De fato, é compreensível que as pessoas esperem que este seja o caso. No entanto, se isto fosse realmente assim, a condição ética de incerteza a respeito dos efeitos das intervenções muitas vezes não se aplicaria. Esta revisão metodológica da Cochrane aborda esta importante questão: "Qual é a probabilidade de verificar em ensaios clínicos randomizados que novos tratamentos são superiores a tratamentos já estabelecidos"? Incluímos nesta revisão quatro coortes de ensaios clínicos randomizados consecutivos, com financiamento público. Estes estudos incluíam um total de 743 ensaios clínicos randomizados com 297.744 participantes. Descobrimos que, em média, os novos tratamentos tinham uma probabilidade apenas ligeiramente maior de ter resultados favoráveis do que os tratamentos já estabelecidos. Estes resultados se aplicam tanto para os desfechos primários quanto para o desfecho de sobrevida global. Em outras palavras, quando novos tratamentos são comparados com tratamentos estabelecidos em ensaios clínicos randomizados, podemos esperar que um pouco mais da metade seja melhor, e um pouco menos da metade seja pior do que os tratamentos já estabelecidos. Estes resultados são consistentes com as condições éticas prévias para a randomização de participantes a tratamentos diferentes em ensaios clínicos. Esta condição diz respeito à necessidade de haver uma incerteza genuína sobre qual dos tratamentos que estão sendo comparados se revelará superior e que os resultados não sejam previstos com antecedência.

Conclusão dos autores: 

A sociedade pode esperar que um pouco mais da metade dos novos tratamentos experimentais se revelem melhores do que os tratamentos já estabelecidos quando estes tratamentos forem testados em ECRs. Entretanto, poucos tratamentos novos serão muito melhores que os já estabelecidos. Este é um achado importante para os pacientes (já que eles participam de ECRs), pesquisadores (já que eles planejam o desenho dos novos estudos) e financiadores (já que eles avaliam o "retorno do investimento"). Fornecemos as melhores evidências atuais sobre a questão da "taxa de sucesso" esperada de tratamentos novos versus tratamentos estabelecidos. Estes resultados são concordantes com a necessidade de haver "equipoise” ou incerteza sobre qual dos tratamentos que estão sendo comparados se revelará superior e que os resultados não sejam previstos com antecedência. Entretanto, nossa amostra representa menos de 1% de todos os ensaios clínicos randomizados disponíveis. Portanto, deve-se ter cautela na interpretação de nossas conclusões. Além disso, não incluímos estudos financiados por patrocinadores comerciais em nossa análise. Portanto, nossa conclusão se aplica apenas aos estudos financiados por fundos públicos.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A proporção de novos tratamentos propostos que são "bem-sucedidos" é assunto de importância ética, científica e pública. Investigamos com que freqüência os novos tratamentos experimentais avaliados em ensaios clínicos randomizados (ECRs) são superiores aos tratamentos estabelecidos.

Objetivos: 

Nossa pergunta principal era: "Em média, com que freqüência os novos tratamentos são mais eficazes, igualmente eficazes ou menos eficazes do que os tratamentos estabelecidos"? Além disso, quisemos explicar os resultados observados, ou seja, se a distribuição observada dos resultados é consistente com o "requisito de incerteza" para o recrutamento de participantes para ECRs. Também avaliamos o efeito da escolha do elemento de comparação (ativo versus nenhum tratamento/placebo) nos resultados observados.

Métodos de busca: 

Fizemos buscas no Cochrane Methodology Register (CMR) 2010, Edição 1 na The Cochrane Library (em 31 de março de 2010); MEDLINE Ovid 1950 até a Semana 2 de março de 2010 (em 24 de março de 2010); e EMBASE Ovid 1980 até a Semana 11 de 2010 (em 24 de março de 2010).

Critério de seleção: 

Consideramos elegíveis para análise as coortes de estudos que atendessem a todos os critérios a seguir: (i) séries consecutivas de ECRs, (ii) registradas no início ou antes do início do estudo, e (iii) que compararam tratamentos novos versus tratamentos já estabelecidos em humanos.

Coleta dos dados e análises: 

Quatro coortes de ECRs preencheram todos os critérios de inclusão. Estes estudos forneceram dados de 743 ECRs com um total de 297.744 participantes. Todas as quatro coortes consistiam de estudos financiados por fundos públicos. Duas coortes envolveram avaliações de novos tratamentos para câncer, uma em distúrbios neurológicos e outra para tipos mistos de doenças. Utilizamos a estimativa de densidade de Kernel, metanálise e metarregressão para avaliar a probabilidade de novos tratamentos terem efeitos superiores aos tratamentos estabelecidos nos desfechos primários e na sobrevida global.

Principais resultados: 

A distribuição dos efeitos vistos foi geralmente simétrica quanto ao tamanho da diferença entre tratamentos novos e tratamentos estabelecidos. A metanálise indicou que, em média, os novos tratamentos foram apenas ligeiramente mais favoráveis tanto em termos de seu efeito na redução dos desfechos primários (hazard ratio (HR)/odds ratio (OR) 0,91, intervalo de confiança (IC) 99% 0,88 a 0,95) quanto na melhora da sobrevida global (HR 0,95, IC 99% 0,92 a 0,98). Não observamos nenhuma heterogeneidade na análise dos desfechos primários ou na sobrevida global (I2 = 0%). A análise de densidade de Kernel foi consistente com a metanálise. Entretanto, esta análise mostrou uma distribuição bastante simétrica de tratamentos novos versus tratamentos estabelecidos. Isto indica a imprevisibilidade dos resultados. Estes resultados são consistentes com a interpretação de que os novos tratamentos são apenas ligeiramente superiores aos tratamentos estabelecidos quando testados em ECRs. Além disso, a metarregressão mostrou que os resultados permaneceram estáveis ao longo do tempo e que a taxa de sucesso dos novos tratamentos não mudou nos ensaios clínicos durante os últimos 50 anos. Os resultados não foram significativamente afetados pela escolha do elemento de comparação (ativo versus nenhum tratamento/placebo).

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil (Ana Carolina Pereira Nunes Pinto). Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com

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