O sulfato de magnésio é efetivo para as crises da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)?

Introdução

A DPOC é uma doença pulmonar de longo prazo que provoca o estreitamento das vias aéreas. As crises da DPOC são episódios de agravamento dos sintomas em pessoas diagnosticadas com DPOC, descritos como exacerbações nesta revisão. O sulfato de magnésio é relatado como capaz de dilatar as vias respiratórias para ajudar na respiração. O sulfato de magnésio pode ser administrado como uma infusão nas veias ou como uma inalação através de um dispositivo chamado nebulizador. Alguns estudos têm mostrado que o sulfato de magnésio pode auxiliar como um complemento aos cuidados habituais em pessoas com crises da DPOC. Portanto, queríamos descobrir se o uso de sulfato de magnésio era melhor ou pior do que outras alternativas, tais como apenas os cuidados habituais ou placebo. Placebo é uma infusão ou inalação de soro fisiológico normal (água salgada) através de um nebulizador.

Características do estudo

Incluímos 11 estudos que envolveram 762 pessoas com crises da DPOC. Estes estudos foram financiados pelas autoridades locais de saúde, pesquisadores ou universidades onde os pesquisadores trabalham. Normalmente, nem os participantes nem as pessoas que faziam a pesquisa sabiam qual tratamento os participantes estavam recebendo; embora em um estudo, o tratamento era conhecido pelas pessoas que estavam fazendo a pesquisa. Foram feitos estudos em um ou dois centros em muitos países entre 2004 e 2018. A idade média dos participantes variou de 62 a 76 anos. Sete estudos testaram a infusão de magnésio, três estudos avaliaram a inalação de magnésio, e um estudo examinou ambos. As evidências nesta revisão são atuais até 2 de agosto de 2021.

Resultados principais

As pessoas que receberam a infusão de magnésio podem ter menos internações no hospital a partir do pronto-socorro. Sete pessoas com crises de DPOC precisariam ser tratadas com infusão de magnésio para evitar que mais uma pessoa fosse internada no hospital. Houve pouca ou nenhuma diferença em termos de suporte de respiração sem necessidade de intubação (colocar um tubo na traqueia para ajudar uma pessoa a respirar). Nenhum dos participantes necessitou de assistência ventilatória com necessidade de intubação. Os estudos incluídos não relataram admissão ou mortes na UTI. Apenas um estudo relatou eventos adversos graves, mas ninguém no estudo apresentou um evento. A infusão de magnésio pode reduzir a duração da internação hospitalar e reduzir a falta de ar. Entretanto, não está claro sobre seu efeito na função pulmonar, concentração de oxigênio no sangue ou eventos adversos.

A inalação de magnésio (nebulizador) teve pouco ou nenhum efeito na admissão hospitalar ou na necessidade de suporte respiratório (com ou sem intubação) em comparação com o placebo. O magnésio nebulizado pode reduzir a admissão na UTI e melhorar a falta de ar. No entanto, não estamos confiantes nestas descobertas devido ao pequeno número de participantes e às limitações do estudo. Não há evidência de uma diferença na duração da hospitalização, função pulmonar ou saturação de oxigênio no sangue. Não foram relatados eventos adversos graves. Não há dados disponíveis para eventos adversos. Um julgamento relatou uma morte no grupo de placebo, mas não estamos confiantes para tirar qualquer conclusão, pois o estudo teve poucos participantes.

Apenas um estudo comparou a inalação e a infusão de sulfato de magnésio com a infusão de brometo de ipratrópio inalado e placebo. Não pudemos identificar nenhuma diferença entre os efeitos desses tratamentos.

Limitações das evidências

A infusão de magnésio pode reduzir as admissões hospitalares, diminuir o tempo de internação e melhorar a falta de ar em comparação com o placebo. Estamos muito incertos sobre seu efeito na necessidade de suporte respiratório, função pulmonar ou concentração de oxigênio no sangue porque os estudos foram pequenos. Não temos informações suficientes para avaliar quaisquer efeitos sobre eventos adversos graves ou mortes. Os efeitos da inalação de magnésio em comparação com placebo ou sulfato de magnésio versus brometo de ipratrópio não são claros.

A infusão de sulfato de magnésio pode ser útil como um tratamento adicional para as crises da DPOC. No entanto, não foi possível estabelecer conclusões se a inalação de sulfato de magnésio é útil para o uso em pessoas com crises de DPOC.

Conclusão dos autores: 

O sulfato de magnésio intravenoso pode estar associado a menos internações hospitalares, redução do tempo de internação e melhora na pontuação de dispneia em comparação com o placebo. Não há evidência de uma diferença entre infusão de magnésio e placebo para VNI, função pulmonar, saturação de oxigênio ou eventos adversos. Não encontramos evidências para admissão na UTI, intubação endotraqueal, eventos adversos graves ou mortalidade.

Para o sulfato de magnésio nebulizado, não se pode estabelecer conclusões sobre seus efeitos nas exacerbações da DPOC para a maioria dos desfechos. Os estudos relataram sobre um possível menor número de admissões na UTI e um menor grau de dispneia com inalação de magnésio em comparação com placebo; no entanto, são necessários estudos maiores para produzir uma estimativa mais precisa para estes desfechos. Da mesma forma, não conseguimos identificar nenhuma evidência robusta do sulfato de magnésio em comparação com o brometo de ipratrópio. São necessários futuros ensaios multicêntricos bem desenhados com amostras maiores, incluindo subgrupos de acordo com a gravidade das exacerbações e os fenótipos da DPOC.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) tem caráter crônico e progressivo, e muitas vezes é marcada por surtos ou exacerbações recorrentes. O sulfato de magnésio tem um efeito broncodilatador, e pode ter uma função como tratamento complementar nas exacerbações da DPOC. No entanto, são necessárias evidências abrangentes de seus efeitos para facilitar a tomada de decisões clínicas.

Objetivos: 

Avaliar os efeitos do sulfato de magnésio para exacerbações agudas da doença pulmonar obstrutiva crônica em adultos.

Métodos de busca: 

Pesquisamos a Cochrane Airways Trials Register, CENTRAL, MEDLINE, Embase, ClinicalTrials.gov, o portal da World Health Organization (WHO) , o EU Clinical Trials Register e o Iranian Registry of Clinical Trials. Também pesquisamos os anais das principais conferências de pneumologia e as listas de referência de estudos incluídos até 2 de agosto de 2021.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios clínicos randomizados (ECR) simples ou duplo cego de grupos paralelos que avaliaram o sulfato de magnésio em adultos com exacerbações da DPOC. Excluímos os estudos do tipo cross-over.

Coleta dos dados e análises: 

Seguimos as recomendações metodológicas padrões previstas pela Cochrane. Dois autores da revisão selecionaram os estudos de forma independente para a inclusão, extraíram os dados e avaliaram o risco de viés. Os desfechos primários foram: admissões hospitalares (na sala de emergência); necessidade de ventilação não invasiva (VNI), ventilação assistida ou admissão na unidade de terapia intensiva (UTI); e eventos adversos graves. Os desfechos secundários foram: tempo de hospitalização, mortalidade, eventos adversos, escore de dispneia, função pulmonar e medição de gases no sangue. Avaliamos a certeza das evidências usando a metodologia GRADE. Entramos em contato com os autores dos estudos incluídos para obter os dados faltantes.

Principais resultados: 

Identificamos 11 ECRs (10 duplo-cegos e 1 simples-cego) com um total de 762 participantes. A idade média dos participantes variou de 62 a 76 anos. Os ensaios foram realizados em um ou dois centros no Irã, Nova Zelândia, Nepal, Turquia, Reino Unido, Tunísia e EUA entre 2004 e 2018. Julgamos que os estudos tinham um baixo ou incerto risco de viés na maioria dos domínios. Três estudos apresentaram alto risco para cegamento e outros vieses.

Sulfato de magnésio intravenoso versus placebo

Sete estudos (24 a 77 participantes) foram incluídos. Poucas pessoas podem requerer internação hospitalar com infusão de magnésio em comparação com placebo (odds ratio (OR) 0,45, 95% IC 0,23 a 0,88; número necessário para tratar para um resultado benéfico adicional (NNTB) = 7; 3 estudos, 170 participantes; baixa certeza da evidência). O magnésio intravenoso pode resultar em pouca ou nenhuma diferença na necessidade de ventilação não-invasiva (OR 0,74, 95% IC 0,31 a 1,75; muito baixa certeza da evidência). Não foram relatados casos de intubação endotraqueal (2 estudos, 107 participantes) ou eventos adversos graves (1 estudo, 77 participantes) em nenhum dos grupos. Os estudos incluídos não relataram admissão na unidade de terapia intensiva (UTI) ou morte. A infusão de magnésio pode reduzir o tempo de hospitalização por uma diferença média (DM) de 2,7 dias (95% IC 4,73 dias para 0,66 dias; 2 estudos, 54 participantes; baixa certeza da evidência) e melhorar o escore da dispneia por uma diferença média padronizada de -1,40 (95% IC -1,83 para -0,96; 2 estudos, 101 participantes; baixa certeza da evidência). Não está claro o efeito da infusão de magnésio na melhora da função pulmonar ou da saturação de oxigênio. Para todos os eventos adversos, o Peto OR foi de 0,14 (95% IC 0,02 a 1,00; 102 participantes); entretanto, a taxa de eventos foi muito baixa para se chegar a uma conclusão robusta.

Sulfato de magnésio nebulizado versus placebo

Foram incluídos três estudos (20 a 172 participantes). A inalação de magnésio pode ter pouco ou nenhum impacto na admissão hospitalar (OR 0,77, 95% IC 0,21 a 2,82; muito baixa certeza da evidência) ou necessidade de suporte ventilatório (VNI ou ventilação mecânica) (OR 0,33, 95% IC 0,01 a 8,20; muito baixa certeza da evidência). Pode resultar em menos internações na UTI em comparação com placebo (OR 0,39, 95% IC (abreviação de intervalo de confiança) 0,15 a 1,00; muito baixa certeza da evidência) e melhoria da dispneia (DM -14,37, 95% IC -26,00 a -2,74; 1 estudo, 20 participantes; muito baixa certeza da evidência). Não foram relatados eventos adversos graves em nenhum dos grupos. Houve uma morte relatada no braço do placebo em um ECR, mas o número de participantes era muito pequeno para estabelecer uma conclusão. Houve evidências limitadas sobre o efeito da inalação de magnésio no tempo de hospitalização, nos desfechos de função pulmonar ou na saturação de oxigênio. Os estudos incluídos não relataram eventos adversos.

Sulfato de magnésio versus brometo de ipratrópio

Um único estudo com 124 participantes avaliou o sulfato de magnésio nebulizado mais a infusão de magnésio intravenoso versus o ipratrópio nebulizado mais a solução salina normal intravenosa. Houve pouca ou nenhuma diferença entre estes grupos em termos de admissão hospitalar (OR 1,62, IC 95% 0,78 a 3,37), intubação endotraqueal (OR 1,69, IC 95% 0,61 a 4,71) e tempo de internação hospitalar (DM 1,10 dias, IC 95% -0,22 a 2,42), todos com muito baixa certeza da evidência. Não havia dados disponíveis para ventilação não-invasiva, admissão na UTI e eventos adversos graves. Os eventos adversos não foram relatados.

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil (Aline Rocha e Aléxia Gabriela da Silva Vieira). Contato: tradutores.cochrane.br@gmail.com

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