Formas de expulsar a placenta no terceiro período do trabalho de parto

Qual é o problema?

O objetivo desta Revisão Cochrane foi avaliar as várias formas da placenta sair do corpo da mulher depois do bebê ter nascido: a forma ativa, a forma passiva e a forma mista. Nossa pergunta foi: quais são os benefícios e danos dessas diferentes formas de expulsar a placenta para todas as mulheres, e em particular para as mulheres com baixo risco de sangramento grave (hemorragia)? Procuramos por todos os estudos relevantes sobre essa questão existentes até 22 de janeiro de 2018 e avaliamos seus resultados.

Por que isso é importante?

O parto é dividido em três períodos. No primeiro período, o colo do útero dilata até atingir 10 cm; no segundo período, o bebê desce pela vagina e nasce; no terceiro período, a placenta se solta do útero e sai pela vagina. A placenta se solta do útero no terceiro período porque o útero continua a contrair após o nascimento do bebê. A mãe então elimina a placenta pela vagina, de forma espontânea. Isso é chamado de manejo expectante do terceiro período. O manejo ativo do terceiro período envolve três componentes: 1) a administração de um remédio para ajudar a contrair o útero (uterotônico); 2) a ligadura precoce do cordão umbilical, geralmente antes, junto com ou imediatamente depois de dar o uterotônico; 3) aplicar tração no cordão umbilical junto com uma contra-pressão no útero para facilitar a saída da placenta (tração controlada do cordão). O manejo misto do terceiro período do parto consiste no uso de algumas, mas não todas essas medidas. O manejo ativo do terceiro período foi introduzido para tentar reduzir o risco das mulheres terem uma perda de sangue excessiva no parto. A hemorragia pós-parto (HPP) é uma causa importante de morte materna nos países de baixa renda, onde muitas mulheres são desnutridas, anêmicas e têm doenças infecciosas. Em países desenvolvidos, a HPP ocorre com uma frequência muito menor. Porém, a conduta ativa no terceiro período ainda é usada de forma rotineira em todos os partos em muitos países.

Que evidência encontramos?

Encontramos oito estudos com dados de 8892 mulheres e seus bebês. Todos os estudos foram realizados em hospitais, sete em países de alta renda e um em um país de baixa renda. Quatro estudos compararam o manejo ativo versus o manejo expectante, e quatro estudos compararam o manejo ativo versus o manejo misto.

No geral, a qualidade da evidência foi geralmente baixa ou muito baixa. Portanto, precisamos de mais dados para estarmos confiantes em relação aos resultados. Para as mulheres em geral (independentemente do risco de ter hemorragia grave), o manejo ativo pode reduzir o risco de hemorragia grave e de anemia. Porém, essa conduta pode também reduzir o peso do bebé ao nascer e aumentar a pressão arterial da mãe, suas dores pós-parto e vômitos e pode aumentar o número de mulheres que voltam ao hospital com hemorragias. Os resultados foram semelhantes para as mulheres com baixo risco de sangramento. Porém, não ficou claro se existe alguma diferença na incidência de sangramento grave ou anemia.

O que isso significa?

As mulheres devem receber informações antes do parto para ajudá-las a fazer escolhas informadas. O uso de alguns remédios pode evitar alguns efeitos colaterais nas mulheres. Retardar a ligadura do cordão umbilical pode beneficiar o bebê ao evitar a redução do seu peso ao nascer (devido à ligadura precoce). Porém, é preciso fazer mais mais estudos sobre isso. É possível que apenas o uso do uterotônico seja suficiente para prevenir as hemorragias graves, sem a necessidade dos outros componentes do manejo ativo. É necessário fazer mais estudos sobre esse assunto, especialmente nos países de baixa renda.

Conclusão dos autores: 

Os resultados parecem indicar que a conduta ativa reduz o risco de HPP primária grave superior a 1000 mL no momento do nascimento. Porém, temos dúvidas quanto a esta conclusão pois a qualidade da evidência é muito baixa. A conduta ativa pode reduzir a incidência de anemia materna (Hb < 9 g/dL) após o nascimento. Porém, essa intervenção também pode estar associada a eventos adversos como hipertensão e dor após o parto, assim como retorno ao hospital devido a sangramento.

Em mulheres de baixo risco para hemorragia excessiva, é incerto se existe uma diferença entre a conduta ativa versus expectante para HPP grave ou Hb materna < 9 g/dL (avaliada entre 24 e 72 horas após o parto). As mulheres poderiam receber informações sobre os benefícios e danos das diferentes condutas no terceiro período para que possam fazer uma escolha informada. Devido às preocupações com a ligadura precoce do cordão e os potenciais efeitos adversos de alguns uterotônicos, é fundamental que os novos estudos avaliem os componentes individuais da conduta ativa no terceiro período. Também são necessários estudos conduzidos em países de baixa renda.

Deve ser enfatizado que esta revisão incluiu apenas um pequeno número de estudos com um número relativamente pequeno de participantes, e que a qualidade da evidência para os desfechos primários é baixa ou muito baixa.

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

A conduta ativa no terceiro período do parto envolve o uso de uterotônico profilático, ligadura precoce do cordão umbilical e tração controlada do cordão para facilitar a expulsão da placenta (dequitação). Na conduta expectante, o profissional de saúde aguarda os sinais de que a separação da placenta ocorreu, e a placenta é então eliminada espontaneamente. A conduta ativa foi introduzida para tentar reduzir a hemorragia pós-parto (HPP), um dos principais contribuintes para a mortalidade materna em países de baixa renda. Esta é uma atualização de uma revisão publicada pela última vez em 2015.

Objetivos: 

Comparar os efeitos da conduta ativa versus expectante no terceiro período do trabalho de parto sobre os riscos de HPP e sobre outros desfechos maternos e neonatais.

Comparar os efeitos das variações nos diversos componentes da conduta ativa e expectante no terceiro período do trabalho de parto sobre a HPP primária grave e outros desfechos maternos e neonatais.

Métodos de busca: 

Para esta atualização, fizemos buscas nas seguintes bases de dados em 22 de janeiro de 2018: Cochrane Pregnancy and Childbirth's Trials Register, ClinicalTrials.gov e World Health Organization International Clinical Trials Registry Platform (ICTRP). Também revisamos as listas de referências dos estudos recuperados.

Critério de seleção: 

Incluímos ensaios clínicos randomizados controlados (ECR) ou quasi randomizados que compararam a conduta ativa versus a conduta expectante no terceiro período do trabalho de parto. Os ensaios clínicos tipo cluster também poderiam ser incluídos na revisão, mas não encontramos nenhum.

Coleta dos dados e análises: 

Dois autores de revisão, trabalhando de forma independente, selecionaram os estudos para inclusão, avaliaram o risco de viés, realizaram a extração dos dados e avaliaram a qualidade das evidências utilizando a abordagem GRADE.

Principais resultados: 

Incluímos oito estudos e analisamos os dados de 8892 mulheres. Os estudos foram todos realizados em hospitais. Sete estudos foram conduzidos em países de maior renda e um foi realizado em um país de menor renda. Quatro estudos compararam conduta ativa versus expectante, e quatro compararam conduta ativa versus conduta mista. Fizemos metanálises usando o modelo de efeitos randômicos devido à heterogeneidade clínica entre os estudos. Três dos oito estudos tinham baixo risco de viés para geração de sequência de randomização, sigilo de alocação e completude da coleta de dados. Não existe evidência de alta qualidade (segundo o GRADE) para nossos desfechos primários. Isso explica nosso uso dos termos condicionais na descrição dos resultados apresentados a seguir.

Para as mulheres com risco variável de hemorragia, é incerto se a conduta ativa reduz o risco médio de HPP primária grave (mais de 1000 ml) no momento do nascimento (razão de risco média (RR) 0,34, intervalo de confiança (IC) de 95% 0,14 a 0,87, 3 estudos, 4636 mulheres, I2 = 60%; evidência de qualidade muito baixa). A conduta ativa do terceiro período pode reduzir o número de mulheres com anemia (hemoglobina-Hb- menor que 9 g/dL) após o nascimento (RR 0,50, IC 95% 0,30 a 0,83, 2 estudos, 1572 mulheres; evidência de baixa qualidade). O manejo ativo pode fazer pouca ou nenhuma diferença no número de bebês admitidos em unidades neonatais (RR 0,81, IC 95% 0,60 a 1,11, 2 estudos, 3207 bebês; evidência de baixa qualidade). É incerto se o manejo ativo reduz o número de bebês com icterícia que precisa de tratamento (RR 0,96, IC 95% 0,55 a 1,68, 2 estudos, 3142 bebês, I2 = 66%; evidência de qualidade muito baixa). Não encontramos dados sobre nossos outros desfechos primários de HPP muito grave no momento do nascimento (mais de 2500 ml), mortalidade materna, ou policitemia neonatal que precisa de tratamento.

A conduta ativa reduz o volume médio de perda sanguínea no parto e provavelmente reduz a taxa de mulheres com perda sanguínea primária > 500 ml, e o uso terapêutico de uterotônicos. A conduta ativa também provavelmente reduz o peso médio ao nascer do bebê. Isso provavelmente reflete a menor passagem de sangue da placenta para o neonato em decorrência da conduta ativa. Além disso, a conduta ativa pode reduzir a necessidade da parturiente receber uma transfusão de sangue. Porém, o manejo ativo pode aumentar a pressão arterial diastólica materna, a incidência de vômitos e de cólicas após o parto, o uso de analgesia entre o parto e a alta da ala de parto, e o número de mulheres que retornam ao hospital com sangramento (desfecho não pré-especificado).

Nas análises apenas com mulheres de baixo risco para sangramento excessivo, os resultados foram semelhantes. A única exceção foi que a evidência é incerta quanto a existência de alguma diferença entre os grupos para HPP primária grave (RR 0,31, IC 95% 0,05 a 2.17; 2 estudos, 2941 mulheres, I2 = 71%), Hb materna < 9 g/dL entre 24 e 72 horas (RR 0,17, IC 95% 0,02 a 1,47; 1 estudo, 193 mulheres) ou a necessidade de internação neonatal (RR 1,02, IC 95% 0,55 a 1,88; 1 estudo, 1512 mulheres). Neste grupo, a conduta ativa pode fazer pouca diferença para a taxa de icterícia neonatal que requer fototerapia (RR 1,31, IC 95% 0,78 a 2,18; 1 estudo, 1447 mulheres).

Teoricamente, a modificação de alguns componentes do manejo ativo (como não usar derivados da ergotamina e adiar a ligadura do cordão) poderia evitar a hipertensão e a interferência com a transfusão placentária. Porém, não temos nenhuma evidência direta sobre isso.

Notas de tradução: 

Tradução do Cochrane Brazil (Maria Regina Torloni). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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