Exercício físico para crianças e jovens adultos durante e depois do tratamento de câncer infantil

Introdução

O câncer infantil é menos comum do que câncer em adultos; há 144 a 148 casos por cada 1 milhão de crianças. Para que a criança fique curada, frequentemente é necessário fazer um tratamento intensivo que inclui cirurgia, quimioterapia, radioterapia ou combinações desses. Esses tipos de tratamento são frequentemente acompanhados de efeitos adversos, como enjoo (náusea), infecções graves, danos em órgãos (coração, pulmão, rim, fígado) e fragilidade óssea (devido à falta de cálcio), e a criança pode também ter diminuição da força muscular e da sua aptidão física.

No passado, as crianças eram orientadas a se recuperar em repouso, e descansar o máximo possível. Hoje em dia, acredita-se que muito repouso pode levar à piora da aptidão e da função física da criança. Esses efeitos adversos podem ser prevenidos ou reduzidos através de programas de exercício físico durante ou logo depois do tratamento do câncer infantil.

Características dos estudos

Nós buscamos, nas bases científicas, por estudos que avaliaram os efeitos de programas de exercício físico nos primeiros cinco anos depois do diagnóstico de câncer infantil comparados com nenhum treino. Os participantes dos estudos tinham menos de 19 anos e qualquer tipo de câncer infantil. A evidência está atualizada até novembro de 2014.

Resultados principais

Esta revisão incluiu cinco ensaios clínicos randomizados controlados (estudos clínicos em que as pessoas são sorteadas para entrar em algum grupo de tratamento) e um ensaio clínico controlado (estudo clínico em que as pessoas entram em algum grupo de tratamento, mas sem sorteio) que avaliaram os efeitos do exercício físico em crianças durante seu tratamento de câncer. A leucemia linfoblástica aguda infantil (LLA) é um câncer dos glóbulos brancos do sangue e é o tipo mais comum de cancer infantil. Por essa razão, muitos pesquisadores geralmente fazem estudos nesse tipo de câncer já que é possível incluir um maior número de pacientes num menor espaço de tempo. No total, nossa análise incluiu 171 participantes com LLA. Os resultados da revisão mostraram que existem pequenos benefícios do exercício físico na composição corporal (porcentagem de gordura, músculos e ossos), flexibilidade, aptidão cardiorrespiratória (o quanto o seu coração e o seu pulmão conseguem distribuir oxigênio para o seu corpo), força muscular e qualidade de vida. Porém, a evidência é limitada. A falta de evidências confiáveis pode ter acontecido por causa de programas de exercício que não são adequados para crianças com câncer, ou devido ao fato de que os estudos foram mal desenhados. Precisamos de mais estudos para avaliar os efeitos do exercício em crianças com diversos tipos de câncer. Além disso, os achados atuais não fornecem evidência suficiente para identificar o melhor programa de exercício físico para crianças com câncer, nem fornecem informação das características da população que pode ou não se beneficiar da intervenção. Essas questões importantes ainda precisam ser esclarecidas.

Conclusão dos autores: 

Os efeitos do treinamento físico para pacientes com câncer infantil ainda não são convincentes. Talvez isso seja devido ao pequeno número de participantes e os desenhos de estudo insuficientes, mas também pode ocorrer pelo fato de essa intervenção não ser tão efetiva em crianças como é em adultos com câncer. Contudo, os primeiros resultados mostram efeitos positivos na aptidão física do grupo intervenção em comparação com o grupo controle. Houve efeitos positivos da intervenção na composição corporal, flexibilidade, aptidão cardiorrespiratória, força muscular e qualidade de vida relacionada à saúde (itens relacionados ao câncer). Esses desfechos foram medidos por alguns instrumentos de avaliação, mas não todos. Porém, a qualidade da evidência foi baixa e esses efeitos positivos não foram encontrados para outros desfechos avaliados como fadiga, nível de atividade diária e eventos adversos. Precisamos de mais estudos com objetivos e intervenções comparáveis, com um número maior de participantes que tenham outros tipos de câncer além de leucemia linfoblástica aguda (LLA).

Leia o resumo na íntegra...
Introdução: 

Os pacientes e os sobreviventes do câncer infantil podem apresentar redução da aptidão física. Isso é devido aos efeitos negativos da doença e do tratamento de câncer infantil. Estudos com pacientes adultos com câncer frequentemente mostram que o exercício físico melhora a aptidão física. Recentemente, estudos sobre exercício físico para crianças e jovens adultos, tanto durante quanto após o tratamento do câncer, também foram publicados. Esta é uma atualização da revisão original que foi publicada em 2011.

Objetivos: 

Avaliar o efeito do treinamento físico realizado durante ou após o tratamento para o câncer na aptidão física (por exemplo, capacidade aeróbica, força muscular, ou performance funcional) de crianças com câncer nos primeiros cinco anos de diagnóstico, comparado com um grupo controle de crianças com câncer que não receberam o treinamento físico como intervenção.

Avaliar se o exercício físico nos primeiros cinco anos de diagnóstico tem algum efeito na fadiga, ansiedade, depressão, auto-eficácia e qualidade de vida e avaliar se a intervenção está associada a efeitos adversos.

Métodos de busca: 

Nós buscamos nas bases eletrônicas: Cochrane Register of Controlled Trials (CENTRAL), MEDLINE, EMBASE, CINAHL, e PEDro. Também fizemos buscas nas plataformas de registros de estudos em andamento e em anais de congressos. As buscas foram feitas em 6 de setembro de 2011 e em 11 de novembro de 2014. Além disso, realizamos busca manual nas listas de referências.

Critério de seleção: 

A revisão incluiu ensaios clínicos randomizados (ECRs) e estudos clínicos controlados (CCTs) que compararam os efeitos do exercício físico versus nenhum treino, em pessoas que estavam nos primeiros cinco anos do diagnóstico de câncer infantil.

Coleta dos dados e análises: 

Dois autores da revisão, independentemente, identificaram os estudos que preencheram os critérios de inclusão, realizaram a extração de dados e avaliaram o risco de viés dos estudos usando formulários padronizados. A qualidade dos estudos foi avaliada usando os critérios do GRADE (Grading of Recommendation Assessment, Development and Evaluation).

Principais resultados: 

Além dos cinco estudos da revisão original, esta atualização incluiu um ensaio clínico adicional. No total, a análise incluiu 171 participantes, todos em tratamento de leucemia linfoblástica aguda (ALL).

A duração das sessões de treinamento variou entre 15 e 60 minutos. Tanto o tipo de intervenção quanto seu período variaram em todos os estudos incluídos. Porém, o grupo controle sempre recebia cuidado usual.

Todos os estudos tinham limitações metodológicas, como pequeno número de participantes, métodos de randomização incertos e um ensaio clínico randomizado com mascaramento simples. A qualidade das evidências para todos os resultados foi classificada como muito baixa a moderada (GRADE).

A aptidão cardiorrespiratória foi avaliada através do teste de caminhada de 9 minutos, teste cronometrado de subida e descida de escadas, teste cronometrado de sentar e levantar e teste de corrida de 20 metros. Os dados dos testes de caminhada de 9 minutos e cronometrado de subida e descida de escadas puderam ser combinados. Os resultados combinados do teste de caminhada de 9 minutos mostraram diferença significante entre os grupos intervenção e controle, em favor do grupo intervenção (diferença de média padronizada (SMD) 0,69; intervalo de confiança (CI) de 95% 0,02 a 1,35). Dados combinados do teste cronometrado de subida e descida de escadas não mostraram diferença significativa na aptidão cardiorrespiratória (SMD -0,54; 95% CI -1,77 a 0,70). Porém, houve heterogeneidade considerável (I2 = 84%) entre os dois estudos que avaliaram esse desfecho. Havia apenas um único estudo para cada um dos outros dois desfechos (teste de corrida de 20 metros e teste cronometrado de sentar e levantar).Os resultados foram positivos para aptidão cardiorrespiratória em favor do grupo intervenção.

Apenas um estudo avaliou o efeito do exercício na densidade mineral óssea (no corpo inteiro). A intervenção produziu um efeito positivo estatisticamente significaante (SMD 1,07; 95% CI 0,48 a 1,66). A combinação dos dados não mostrou diferença estatística significativa no escore final do índice de massa corporal entre os grupos intervenção e controle (SMD 0,59; 95% CI -0,23 a 1,41).

Três estudos avaliaram flexibilidade. Dois estudos avaliaram dorsoflexão do tornozelo, sendo que um deles avaliou dorsoflexão ativa do tornozelo, enquanto o outro avaliou a dorsoflexão passiva do tornozelo. Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos intervenção e controle no teste da dorsoflexão ativa do tornozelo; porém, houve diferença significativa em favor do grupo intervenção no teste da dorsoflexão passiva do tornozelo (SMD 0,69; 95% CI 0,12 a 1,25). O terceiro estudo avaliou flexibilidade corporal utilizando o teste de sentar e alcançar, mas não identificou diferença estatisticamente significante entre os grupos intervenção e controle.

Três estudos avaliaram força muscular (joelho, tornozelo, costas e pernas, e musculatura inspiratória). Apenas a pontuação da combinação do fortalecimento das costas e pernas mostrou diferença estatisticamente significante no escore final da força muscular entre os grupos intervenção e controle (SMD 1,41; 95% CI 0,71 a 2,11).

Exceto pelo escore em uma subescala da escala de câncer (Preocupações; valor de P = 0,03), nenhuma escala de qualidade de vida relacionada à saúde mostrou diferença significativa na avaliação final entre os grupos dos estudos. Para os outros desfechos (avaliados em apenas um estudo) de fadiga, nível de atividade diária e eventos adversos, não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos intervenção e controle.

Nenhum estudo incluído avaliou o gasto energético durante a atividade, tempo para realizar o exercício, ansiedade e depressão, ou autoeficácia como desfechos.

Notas de tradução: 

Tradução do Centro Cochrane Afiliado Muriaé (Rhayssa Espósito) e do Centro Cochrane do Brasil (Carolina de Oliveira Cruz). Contato: tradutores@centrocochranedobrasil.org.br

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